Por: Alice Wakai
Após a aprovação pelo Senado em novembro de 2015, o Projeto de Lei (281/2012), que propõe adaptações ao Código de Defesa do Consumidor, aguarda aprovação na Câmara dos Deputados.
Além de tratar de questões aplicáveis ao varejo tradicional, o projeto dedica um capítulo exclusivo ao e-commerce, abordando temas como privacidade de dados, direito ao arrependimento e envio de e-mails e spam.
Para entender como essas mudanças podem impactar os lojistas, entrevistamos Ricardo Oliveira, sócio do escritório COTS Advogados, especializado em Direito Digital.
Impacto para os lojistas online
ECB: Considerando a proposta de novo texto para o Código de Defesa do Consumidor, com um capítulo exclusivo para o e-commerce, de que forma essas mudanças podem impactar os lojistas online?
Ricardo Oliveira: Praticamente todo o conteúdo do Projeto de Lei do Senado n. 281/2012 (PLS) já havia sido contemplado pelo Decreto n. 7.962/2013, que regulamenta o e-commerce no Brasil, bem como pelo Marco Civil da Internet. Como o decreto é posterior, certamente incorporou grande parte das disposições do PLS, dada a semelhança entre eles. Do ponto de vista prático, e considerando a última versão do PLS, que ainda pode sofrer alterações, não há novidades significativas para o e-commerce nacional.
Pontos positivos e negativos do novo Código
ECB: O que você acha deste novo código? Poderia citar pontos positivos e negativos?
Ricardo: O termo “novo código” não é o mais adequado, pois trata-se de modificações no texto atual do CDC, sem revogá-lo. Sobre o comércio eletrônico, considero positivo o fato de não haver alterações nas premissas básicas já estabelecidas pelo Decreto n. 7.962/2013. Qualquer mudança demandaria custos de adaptação para os lojistas, como o envio do contrato após a realização do pedido, algo que poucos implementam devido ao alto custo.
O principal ponto negativo é a falta de um tratamento mais adequado para o direito de arrependimento, que deveria prever exceções. Além disso, o projeto não protege os lojistas contra cláusulas abusivas impostas pelas operadoras de pagamento. Embora o CDC seja voltado ao consumidor, o desenvolvimento saudável do setor beneficia a sociedade como um todo. Proibir, por exemplo, a retenção de valores pelas operadoras de pagamento por até 180 dias, sem justificativa, seria uma medida mais equilibrada.
O projeto não ouve o outro lado?
ECB: O novo Código de Defesa do Consumidor ignora questões importantes para o e-commerce, como prazos de entrega apertados e autofraude. O texto peca por não ouvir o outro lado?
Ricardo: Durante a tramitação do PLS no Senado, foi aberta consulta pública. O que falta, muitas vezes, é uma organização mais forte do setor para se posicionar de forma coletiva.
Nem sempre os interesses dos lojistas são contrários aos dos consumidores. Por exemplo, aplicar o direito de arrependimento a roupas íntimas ou medicamentos pode gerar riscos à saúde. Se há possibilidade de prevenir danos, por que não fazê-lo?
Problemas comuns não atendidos pelo CDC
ECB: Quais problemas comuns do e-commerce o CDC ainda não consegue atender? Se pudesse sugerir uma inclusão no Código, qual seria?
Ricardo: No dia a dia, vemos problemas recorrentes relacionados ao direito de arrependimento em produtos digitais, personalizados, íntimos, medicamentos, ingressos e passagens. A legislação deveria prever exceções, como ocorre na Comunidade Europeia. Além disso, deveria estabelecer regras claras para o exercício do arrependimento, exigindo que o produto não seja utilizado e esteja em sua embalagem original.
Outro ponto importante é a logística reversa. Atualmente, o CDC exige que a devolução do valor pago inclua o frete, o que onera os lojistas, já que esse custo vai para o transportador. O frete grátis, amplamente utilizado como atrativo comercial, poderia ser tratado de forma diferente para incentivar compras mais conscientes e evitar abusos no direito de arrependimento.
Também enfrentamos desafios com os gateways de pagamento, que aplicam regras abusivas e transferem riscos ao lojista. O legislador perdeu a oportunidade de regulamentar prazos e condições de entrega, o que poderia trazer mais segurança ao setor. Hoje, cada município e estado pode estabelecer suas próprias regras, gerando insegurança jurídica.
Por fim, o projeto deveria prever punições severas para fraudes no comércio eletrônico. O meio digital é altamente suscetível a fraudes, que podem ser cometidas de qualquer lugar do mundo. Preservar a integridade do e-commerce deve ser uma prioridade, pois sua expansão beneficia consumidores e lojistas.
Sobre Ricardo Oliveira
Sócio da COTS Advogados, especializado em Cyberlaw (Direito dos Negócios Digitais), Tecnologia da Informação e E-commerce. Possui extensão universitária em Direito da Tecnologia da Informação pela FGV-EPGE, MBA em Gestão Estratégica de Negócios pela FIAP e especialização em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Mackenzie. Coautor do livro Marco Civil Regulatório da Internet (Editora Atlas, 2014). Atua há quase 10 anos na área jurídica, com foco em empresas de comércio eletrônico e tecnologia da informação.